sábado, 8 de outubro de 2016

30ª sessão: dia 11 de Outubro (Terça-Feira), às 21h30


A nossa trigésima sessão vai ser Thunderbolt and Lightfoot, primeiro filme do grande Michael Cimino, falecido este mês de Julho. Dupla dádiva de um Clint Eastwood de fama cimentada a dois jovens ávidos e talentosos que começavam na altura as suas carreiras, Jeff Bridges e o próprio Cimino. Muito como o que John Wayne e Howard Hawks fizeram em Rio Bravo com Dean Martin: "It's the kid's movie, isn't it? Yeah". Marcará o início da retrospectiva a este cineasta essencial e que se deve pôr ao lado dos maiores e dos mais importantes artistas deste mundo.

O filme será antecedido por uma apresentação em vídeo por Matheus Cartaxo, um dos editores da Foco - Revista de Cinema desde 2009. Graduou-se em Cinema pela Universidade Federal de Pernambuco no ano de 2015 e actualmente faz mestrado sobre a obra de Brian De Palma na mesma universidade. O vídeo foi gravado expressamente para esta sessão.

A Bill Krohn, em 1982, para os Cahiers du Cinéma, Cimino disse que "Thunderbolt and Lightfoot foi inteiramente filmado no Montana, mas em sítios muito diferentes; viajámos muito, especialmente à volta de Great Falls; nas margens do Dearborn e do Missouri; nos campos de trigo a leste de Great Falls. A escola, com a sua divisão única, é uma réplica exacta de uma escola encontrada no outro lado das montanhas, a oeste. Era tão bonito, onde a construímos, que tivemos problemas a afastar os turistas durante a rodagem. Era em Wolfcreek, à entrada de Helena. Filmámos numa cidade pequena a norte de Great Falls, Fort Benton, que é o mais longe a oeste que se pode ir no Missouri, onde o equipamento e os produtos industriais chegam de barco a vapor de St. Louis. As fotografias antigas de Fort Benton mostram centenas de barcos a vapor junto às margens; era de pensar que Fort Benton se fosse transformar numa metrópole. É nesta pequena cidade que Clint, sentado debaixo duma árvore com Jeff, conta o passado dele. Fort Benton tem uma história muito rica no desenvolvimento do Oeste. Foi lá que eles descarregaram a mercadoria toda, para depois a empilhar nas carroças que seguiram o caminho da Oregon Trail, ou se espalharam noutras direcções. Foi uma das regiões onde exploraram as minas de ouro, em Monarch Pass, a leste de Great Falls, o tamanho do Missouri, etc. É uma terra em campo aberto ilimitado. É em grande parte a zona de Charlie Russel: a sul de Great Falls, há um bar onde se encontram muitas das suas pinturas, de uma certa altura; e se se continuar para sul de Great Falls, reconhecem-se muitas das figuras que ele representou nos seus quadros; o território parece muito familiar. Eu achei a terra a leste da Great Divide muito fascinante, porque é lá que as Great Plains se encontram com as montanhas. É muito íngreme; colinas que não se podem subir a pé, especialmente acima da Interstate 2, a norte de Browning, que é uma reserva para Índios Blackfoot. Se se olhar para Este, pode-se ver quase até às Dakotas, e as montanhas elevam-se por todo o lado. O Este é seco e liso, e a Oeste, jaz o Pacífico. Achei que era um sítio de muitos contrastes; o clima é completamente diferente no Este e no Oeste. O que é que se podia pedir mais: algumas das montanhas mais bonitas no mundo, os rios, os pinheiros, os lagos, as planícies; tudo o que se pode desejar."

Já Robin Wood, em From Vietnam to Reagan (num texto que Manuel Cintra Ferreira traduziu para o catálogo da Cinemateca Portuguesa dedicado ao cineasta), escreveu que "O filme começa numa igreja e termina (quase) na sala de uma escola: a sua acção é traçada entre duas das maiores instituições históricas para a socialização, para a construção da normalidade, ambas marcadas pela presença da bandeira americana. Ambas, contudo, são mais apresentadas explicitamente como conchas obsoletas e vazias do que como repositórios de valor. A igreja é o palco para um sermão dado por um falso pastor, ladrão de bancos cadastrado, interrompido por um pistoleiro que tenta assassiná-lo. A escola fora removida da sua localização original e fossilizada como um monumento histórico; a sua importância na narrativa reside no facto de ser usada como esconderijo do saque - por detrás do quadro negro, uma secreta e irónica lição do capitalismo Americano. Thunderbolt/Clint Eastwood, contemplando a escola perto do fim do filme, murmura respeitosamente "História!": a admitida relação periférica entre a imagem e a realidade da América, entre o passado Americano e o presente, liga o filme ao western e ao trabalho subsequente de Cimino. Igreja e escola (ao lado dos pares heterossexuais burgueses de meia idade, ambos caricaturados, associados entre si) representam tudo o que no filme se associa ao conceito de lar. No que se refere a casas, nenhuma das personagens tem uma, ou sequer lamenta a sua ausência: contudo Lightfoot, interrogado sobre se tem "gente", responde "Não sei de ninguém, é esquisito".

"Apesar da relação central, o filme de onde Thunderbolt and Lightfoot deriva mais directamente... é Bonnie and Clyde. O padrão básico da narrativa é muito semelhante: o ponto de partida de ambos os filmes é o encontro fortuito de duas personagens, que, imediatamente atraídas uma pela outra, depressa formam equipa; mais tarde junta-se-lhes uma segunda, um par algo mais velho com o qual um dos membros do par inicial teve ligações no passado. Os quatro formam uma quadrilha, planeiam e executam assaltos. Finalmente tudo acaba por se desfazer, sucedendo a catástrofe e a morte. Há muitas diferenças incidentais, mas a maior é que ambos os pares heterossexuais do filme de Penn se tornam pares masculinos no de Cimino, onde as mulheres não têm qualquer papel na acção central, e do qual está conspicuamente ausente a nostalgia pelo lar perdido que assombra Bonnie and Clyde."

Até Terça-Feira!

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