sábado, 17 de junho de 2017

65ª sessão: dia 20 de Junho (Terça-Feira), às 21h30


James Gray é um dos poucos cineastas americanos que ainda vale a pena seguir. Confundido primeiro como um sucedâneo desinspirado de Francis Ford Coppola e Martin Scorsese, por situar as suas histórias em meios urbanos e redes criminosas sempre com a família por trás de cada decisão, e agora como um formalista e um cineasta académico, por dedicar algum tempo a pensar os planos e as sequências das suas histórias.

É óbvio que qualquer filme de Gray serviria para desfazer críticas tão superficiais como estas, mas escolhemos o segundo de uma obra em que um mundo se descobre e desvenda por olhares, grandes e pequenos gestos, movimentos de câmara entre a luz e os abismos, decisões trágicas no turbilhão do mundo e actores em completo estado de graça. Fica sempre a certeza de que o trabalho de Gray é só minucioso para potenciar a descoberta e o pensamento - a revelação.

The Yards é portanto a nossa próxima sessão e para o apresentar em vídeo teremos Linara Siqueira, colaboradora da FOCO - Revista de Cinema e grande admiradora da obra do cineasta.

James Gray, quando Jordan Mintzer lhe perguntou se havia elementos auto-biográficos neste filme, nas Conversations with James Gray, respondeu que "(...) eu estava a tentar lidar com um par de coisas diferentes, sendo uma delas como a corrupção e a violência são os princípios organizadores centrais da sociedade. Também estava ansioso em mostrar uma espécie de família de imitação (nota: ersatz no original) - que tentou reconstruir-se a si própria e se manteve junta em parte por inveja de classe, e depois acaba por ser destruída pela corrupção.

"De certa maneira, foi um erro fazê-lo, porque é um tema adequado para um romance russo. Falando em termos narrativos, demorou bastante tempo a estabelecer todas as ligações entre as personagens. Tendo dito isto, em alguns aspectos The Yards é o meu favorito dos meus filmes, mesmo sendo o meu filme menos bem sucedido em todos os níveis: piores críticas, pior box office, e o mais difícil de montar. Talvez goste mais dele como consequência."

Jean Douchet, que nos apresentou Marnie de Alfred Hitchcock em Julho do ano passado, escreveu o prefácio desse livro de conversas (em que também se pronunciam vários colaboradores de Gray e ainda Francis Ford Coppola), notando que "(...) ficou claro desde o seu primeiríssimo filme que James Gray era o que nós nos Cahiers chamávamos de autor. Podia-se detectá-lo imediatamente. E depois de quatro filmes, foi confirmado. O trabalho dele é marcado por um pensamento altamente emocional, sensível e violento, canalizado através de uma mise en scène que é enraizada no cinema clássico de autor.

"Com cada filme, ele volta ao mesmo pensamento uma e outra vez: Não importa o que se faça, os nossos passados são inescapáveis. É a própria definição de tragédia - os passados, e os Deuses, pesam sobre nós com todas as suas forças. Todos os filmes de James Gray consistem numa ou várias personagens a tentar escapar aos seus passados e libertarem-se a si próprios, sabendo o tempo todo que nunca farão tal coisa. Se em O Leopardo Visconti empregou a máxima: “Tem que mudar tudo para que nada mude”, nos filmes de James Gray a máxima podia ser: “Nós queremos que mude tudo, mas sabemos que não pode.”

"O passado no mundo de James Gray significa a Família - a Família no sentido duma mãe, pai e/ou irmão, mas também família num sentido mais amplo que reflecte a sociedade Americana como um todo, com as suas noções do bem e do mal, e a ideia de que toda a boa acção carrega o seu próprio mal dentro dela. Embora a família possa providenciar a fundação do amor, também nos sufoca com o seu único pecado original: restringe a liberdade.

"Em The Yards, a Família é definida pelos clãs mais amplos de políticos e empreiteiros, com cada personagem a usar de subterfúgios para encontrar o seu lugar enquanto caminham na direcção da sua ruína. Em Little Odessa, a personagem de Tim Roth escapa à sua família eliminando-a, enquanto que em We Own the Night, a personagem de Joaquin Phoenix é  implacavelmente trazido de volta à sua família, onde acaba por substituir o pai dele. E em Two Lovers, a mãe interpretada por Isabella Rosselini deixa o filho dela ir, sabendo no entanto que regressará em breve, que é incapaz de sair de casa."

Até Terça!

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